Por Adilson Batista(*)
Se você trabalha com varejo, eu recomendo ficar de olho no mercado chinês. Mesmo que não tenha como ir até lá, vale ler tudo e ver vídeos na internet sobre o que estão fazendo. Eu tive a oportunidade de ver algumas coisas presencialmente em uma visita recente que fiz e fiquei com a sensação de que estava visitando o futuro ou um outro planeta.
Para começar, conheci a Luckin Coffee, a Starbucks deles. Turbinada pelo rápido crescimento de consumo de café pelo povo chinês e pela ambição de bater a Starbucks em número de lojas, a Luckin criou um modelo inovador de varejo que promete abrir uma loja nova a cada 3,5h até o final de 2019 e chegar em 4.500 lojas no total. O mais interessante não é essa corrida deles para ter mais lojas e sim como eles fazem isso acontecer na prática numa velocidade assombrosa. Aprofundando minha observação e estudo do modelo deles, eu notei que a estratégia da empresa é genial. Ao invés de focar em abrir sempre lojas físicas, eles optaram por fazer um mix entre lojas de conveniência e lojas “virtuais” de café. Pois é, isso mesmo, lojas “virtuais” de café. A sacada é simples e poderosa. Na Starbucks, você tem que ir até a loja para pegar um café. Na Luckin, você pode escolher ir à loja ou receber onde estiver, em até 15 minutos. Quem entrega? Um serviço tipo o Rappi, com milhares de motos pequenas que estão conectadas ao sistema da empresa. E sabe quem faz o café? Aqui eu fiquei mais maluco ainda em saber: as donas Wangs. Sim, são pessoas físicas que recebem em seus apartamentos os equipamentos da Luckin em comodato para produzir o café e os entregadores das motoquinhas passam na casa da dona Wang, pegam o café e saem literalmente na velocidade máxima para fazerem as entregas no perímetro ao redor do apartamento da dona Wang. Tudo é controlado por um aplicativo super bem-feito que gerencia todo o processo. Assim, o varejo da Luckin pode escalar para lugares onde a Starbucks não consegue. Mesmo dentro de uma loja de conveniência da Luckin, o consumidor tem que usar o app para pedir, não dá para comprar com cartão de crédito ou dinheiro, só no app. Isso cria o hábito de usar o app o tempo todo para tomar um cafezinho. Eles usam o app para dar créditos de café para cada pessoa que indicar amigos. Assim, é possível muitas vezes comprar um simples café e receber créditos para outros dez, para dividir com amigos. Cada pessoa que ganha um café baixa o app e, assim, a aquisição de clientes entra em um ciclo virtuoso de crescimento exponencial. Nem gastar com propaganda eles precisam.
Outra empresa sensacional é a Rema. A pronúncia do nome é re-má, com acento agudo no final. Eles usam uma fórmula que segue a mesma lógica da Luckin, só que aplicada para supermercado. Essa empresa, cujo símbolo é uma vaquinha, promete entregar produtos FLV (frutas, legumes e verduras) em até 30 minutos. Entregam peixes, literalmente vivos, em saquinhos com água na casa das pessoas. Novamente, as motoquinhas voadoras fazendo seu papel e tudo funcionando via app. As donas Wangs já estão entrando no circuito desse negócio também. Tem gente pegando um cômodo da sua casa para virar estoque de produtos da Rema. Acredita nisso? Pois é. Assim, eles escalam as vendas e abrem presença física como raios caindo do céu em lugares onde não cabe uma loja física grande.
Na mesma linha, vale estudar a Sun Art, que tem o grupo Alibaba como sócio. Mas tem gente grandona de fora da China se dando bem lá também. O Walmart detém a quarta posição no ranking geral de market share do varejo local, está acelerando sua transformação digital por lá e aprendendo com os chineses para aplicar as inovações mundo afora.
Evidentemente, tem coisas que só funcionam lá devido a várias características locais e culturais, porém, para ter insights e aplicá-los de forma adaptada ao nosso mercado, vale muito estudar o já líder mundial em varejo: o mercado chinês.
(*) Adilson Batista é fundador e CEO da Today, agência de transformação digital