Entre os principais efeitos colaterais da inflação em alta estão menos previsibilidade de vendas e queda da competitividade. Gestão focada no planejamento estratégico pode amenizar crise nos negócios
Quando os economistas alertam sobre a importância de estar preparado para as volatilidades econômicas, estão se referindo exatamente a momentos como o de agora. Isso porque a previsão do mercado financeiro para o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) subiu, passando de 3,8% para 3,86%. A estimativa foi anunciada nesta semana no Relatório Focus – pesquisa divulgada semanalmente pelo Banco Central (BC) com as projeções de analistas e instituições. O que mais chama a atenção é que este foi o terceiro aumento seguido para o IPCA em apenas cinco meses.
Diante do cenário, tudo leva a crer que o indicador responsável por medir a inflação oficial do país irá puxar um período marcado por ligeiras altas que devem durar até, pelo menos, 2026.
A previsão é uma alta de 3,74% para 3,75%, em 2025 e de 3,50% para 3,58%, em 2026. Ou seja, se a situação já era vista como ruim pelo presidente do BC, Roberto Campos Neto, as notícias recentes mostraram uma leve piora. As incertezas reverberam tanto no campo internacional como doméstico, mas, sobretudo, internamente após as mudanças na política monetária e na meta fiscal.
Além disso, o Focus estima que 2024 termine com o dólar cotado a R$ 5,05 e no caso da Selic com estabilidade em 10%. Aliás, vale lembrar que, recentemente, a taxa básica de juros brasileira sofreu forte reversão quando, diante das movimentações da moeda americana e outras conjecturas, o BC decidiu por diminuir o ritmo do corte de juros, que vinha sendo de 0,5 ponto percentual, para 0,25 ponto. Em relação ao PIB (Produto Interno Bruto), ele se manteve em 2,05%. Apesar da queda de 2,09% para o nível atual, a perspectiva deu uma arrancada por cerca de dez semanas seguidas. Há pouco mais de um mês, era 1,85%. Em fevereiro, permanecia estável em 1,60%.
E os negócios, ficam como?
Ao contrário do que muita gente pensa, não é apenas no bolso do consumidor que a inflação provoca efeitos colaterais. Aliás, esse é o primeiro sintoma da subida dos preços, condição capaz de causar distorções que aumentam o custo de vida e reduzem o poder de compra, na visão de Clodoaldo Oliveira, diretor da JValério Gestão e Desenvolvimento. Para ele, a imprevisibilidade nos negócios gerada pela volatilidade da economia é praticamente certa, uma vez que com uma parte maior da renda comprometida as pessoas tendem a reduzir ou suspender investimentos relacionados a produtos e serviços não essenciais. “Por consequência, as empresas de ambos os segmentos veem as vendas despencarem e, de quebra, o faturamento”, afirma.
Nesse sentido, o executivo lembra que, além dos resultados comerciais serem afetados, as finanças empresariais também são impactadas pela inflação. Entre as principais consequências estão o aumento dos custos produtivos e operacionais e o encarecimento das linhas de crédito. “Para tentar se proteger desses efeitos, convém elaborar um planejamento estratégico no qual haja foco total no repasse de preços aos clientes, sendo que, muitas vezes, a melhor opção é manter o padrão e a competitividade. Atitudes como a de rever o orçamento a fim de garantir consistência e, quem sabe, implementar alterações que fortaleçam o controle financeiro podem gerar uma desejável segurança frente às turbulências da economia”, recomenda Clodoaldo Oliveira.
O executivo explica ainda que, com o argumento de que não é possível prever o futuro, muitos empresários e gestores ainda ignoram uma regra básica no mundo dos negócios: fazer um planejamento estratégico consistente pensando no curto, médio e longo prazo. “Planejar é primordial em tempos de lentas ou rápidas transformações. imaginar cenários e estar preparados para enfrentá-los é essencial para atravessar qualquer crise e alcançar os resultados almejados”, aponta.
Análise de cenários ajuda os empresários na tomada de decisões
Há mais de 10 anos, o professor da Fundação Dom Cabral (FDC) Paulo Vicente, utiliza os ciclos de Kondratieff. como um modelo para estudar os cenários globais. Conforme essa teoria, o intervalo de 2018 a 2030 corresponde à subfase do quinto ciclo de Kondratieff, que sempre acaba em uma crise que força a reinvenção do capitalismo. O sistema se restabelece por meio do surgimento de uma onda tecnológica, que provoca mudanças culturais e desencadeia transformações sociais e no mercado de consumo. E são essas modificações que projetam saltos na economia. É assim que o capitalismo se sustenta: quando mergulha no caos, consegue emergir graças a uma revolução tecnológica, que acontece a cada 50, 60 anos.
A criação da linha branca é um exemplo clássico de como a inovação foi capaz de resgatar a economia em outra fase do ciclo de Kondratieff. A geladeira, a televisão e a máquina de levar provocaram mudanças culturais. As mulheres enxergaram nos eletrodomésticos uma facilidade que as conduziu para o mercado de trabalho. A renda das famílias aumentou, a economia ficou aquecida e, mais uma vez, o capitalismo conseguiu driblar mais uma crise.
Na década de 90 a internet mudou a forma de fazer negócios. Depois dessa invenção, no período de 2005 a 2018, a economia mundial entrou na fase de esgotamento, que precedeu a crise atual. Em resumo, é assim que se alimenta o ciclo de Kondratieff, em três etapas principais: esgotamento, crise e recuperação. E, com base nele, na visão de Paulo Vicente, até 2030, as empresas terão que se adaptar internamente e prever os cenários globais para conseguir reagir e seguirem sendo competitivas em um tempo de volatilidade na economia.
O mapa de riscos para o período de 2018-2030 já foi desenhado por Paulo Vicente em 2012. Na lista do professor já havia inclusive a previsão de uma pandemia. “Afinal, elas têm ocorrido com certa regularidade desde a década de 1980, mas sempre foram relativamente controladas. Em 2020, esse cenário se concretizou com grande força com a COVID-19. Certamente, é o maior desafio global desde a Segunda Guerra Mundial e a maior pandemia desde a gripe espanhola, de 1918-19. As gerações que viveram no pós-guerra se acostumaram a um mundo de relativa abundância e paz, exceto em regiões de intenso conflito militar, como o Oriente Médio. Vivemos por décadas numa ilusão de segurança e prosperidade constante. Mas quando a pandemia deu uma trégua, desembarcamos em um mundo com uma nova Guerra Fria, provocada pela Rússia. Mais uma vez, a insegurança se instalou. E tempos desesperados, requerem medidas desesperadas. Essa frase resume bem o momento no qual estamos vivendo”, afirma Paulo Vicente.
Mais uma vez, o professor relaciona a crise atual com o modelo de Kondratieff. Cada ciclo terminou numa crise generalizada. O primeiro encerrou no auge das Guerras Napoleônicas (1808-1820); o segundo, em uma série de guerras civis e de unificação (1858-1870); o terceiro, na Primeira Guerra Mundial (1908-1920); o quarto, na Guerra Fria, corrida espacial e crises do petróleo (1968-1980). Agora, a pergunta que fica é qual será a extensão dos problemas e cenários decorrentes da crise gerada pela pandemia e pelo conflito europeu entre Rússia e Ucrânia.
Sem futurologia
Paulo Vicente acredita que é impossível prever o futuro e, por essa razão, não há uma resposta concreta de como os governos e as empresas vão conseguir sair da crise e migrar para a etapa de recuperação, como sugere o ciclo de Kondratieff. “Como não temos clareza dos resultados, sempre uso a técnica de cenários, para pensar em possibilidades e probabilidades, ao invés de buscar “falsas certezas”. Em tempos desesperados, pessoas e governos tomam medidas desesperadas. A história nos mostra que os quatro cavaleiros do apocalipse, a Guerra, a Fome, a Peste e a Morte costumam andar juntos em tempos difíceis. E, mais uma vez, estamos nesta encruzilhada”, aponta o professor.
Ao conhecer o cenário, a próxima empreitada das lideranças é pensar em como será seu negócio daqui há 10 anos, quando o ciclo de Kondratieff atual entra na fase da recuperação. “Esse é o desafio dos empresários: pensar quais as tarefas precisam realizar para ser sustentável e competitivo no horizonte de dez anos. Essa é a linha do planejamento ambidestro. Além disso, é preciso prever, a curto prazo, mudanças abruptas de cenários, porque vivemos num momento de mudanças abruptas e constantes. Daí a necessidade de elencar probabilidades e buscar soluções e estratégias resilientes para sobreviver em diferentes cenários. O ano de 2024, assim como foi 2023, é de gerenciamento de riscos, mas não podemos perder de vista as conquistas que projetamos para o nosso negócio nos próximos dez anos”, propõe o professor.
Todas essas reflexões fazem parte do Parceiros para a Excelência, PAEX, um programa em parceria entre e FDC e a JValério, dirigido para empresas familiares e médias empresas. Os dos principais atributos da solução é a implementação de um modelo robusto de gestão, com a formação de executivos e equipes de alta performance, elevando os resultados de curto, médio e longo prazos. Para saber mais, acesse: PAEX – JValério (jvalerio.com.br).
foto: IStock