Diante do avanço da vacinação no Brasil, as empresas discutem se devem ou não retornar aos escritórios, enquanto seus colaboradores avaliam o modelo de trabalho que desejam para si, com clara preferência de muitos dos mais jovens pelo trabalho remoto e de parte das chefias de gerações anteriores pela modalidade presencial.
Imposto como medida sanitária, o home office trouxe vantagens e desvantagens. Sem dúvida, evitou mortes ao permitir que muitos profissionais não fossem expostos ao vírus e contaminassem a si e seus familiares. Após quase dois anos de teletrabalho compulsório, a maioria das organizações cuja operação não dependia da presença física de seus colaboradores já pôde constatar (com surpresa, diga-se) um aumento de produtividade, mas contrabalançado por alguma dificuldade na comunicação entre as equipes, dúvidas sobre como construir a cultura corporativa à distância e como engajar colaboradores.
Na perspectiva dos funcionários, o home office gerou mais satisfação, ao permitir conciliar o trabalho e a vida pessoal, proporcionar economia em muitos casos com alimentação fora de casa e transporte, além da ausência do desgaste das horas passadas no trânsito ou no transporte público. Novamente esses benefícios foram contrabalançados pelo desgaste com a maior carga de trabalho, com o excesso de reuniões virtuais, com uma separação menos clara entre trabalho e descanso, com a falta de convivência com colegas e com o envolvimento inevitável das questões familiares no trabalho.
Com prós e contras, a experiência de trabalhar à distância acabou por gerar partidários e discordantes entre profissionais e empregadores. Se de um lado, é crescente o número de empresas que optaram por ampliar o número de postos de trabalho remoto, também existem as que não veem a hora de retornar aos escritórios, em nome do controle sobre a equipe, da maior sensação de produtividade ou de outro motivo. Da mesma forma, não são poucos os profissionais que desejam continuar trabalhando de casa, dizendo, inclusive, que vão pedir demissão no caso de serem obrigados a retornar, ao lado dos que desejam o retorno por não ter em casa condições de trabalho. O que fazer então?
Antes, um dado da realidade. Ao que tudo indica, o mercado vai continuar oferecendo oportunidades presenciais e remotas, de forma que as empresas a insistir num modelo ou em outro vão impor a si limitações desnecessárias para acessar e reter talentos que podem contribuir de casa usando pijamas ou no escritório de terno e gravata. Portanto, mais útil do que advogar em favor do ou contra o home office, é reconhecer que determinadas pessoas são mais produtivas em casa, ao passo que outras precisam do ambiente corporativo. O desafio das organizações, portanto, é selecionar o perfil mais apto a cada modalidade e disponibilizar a oportunidade adequada.
Romantizar o home office também é pouco prudente. Se é fato que a modalidade pode ser mais produtiva, além de um diferencial na atração de talentos, também é verdade que há riscos relacionados principalmente à saúde mental. As empresas que optarem pelo home office permanente ou parcial devem fazê-lo de forma responsável adotando também mecanismos de monitoramento da saúde física e mental, além de estratégias de mitigação de efeitos nocivos, tendo em mente que o retorno do convívio social e o restabelecimento das redes de apoio necessárias ao cuidado com as crianças vão fatalmente acontecer com a vacinação em massa e minimizar muitos desses problemas.
O conflito entre partidários do home office e os a favor do retorno integral aos escritórios, tampouco parece ser uma questão objetiva. Diante de um cenário em que o home office dá sinais de ter chegado para ficar com seus prós e contras na pandemia e depois dela, certamente a atitude mais adequada para as lideranças é buscar aproveitar seus benefícios e lidar com seus problemas. A preferência pelo trabalho remoto ou presencial é mais uma das muitas expressões da diversidade humana e, como tal, não deve ser polarizada, apenas aceita, acolhida e bem-aproveitada.
O debate mais útil, portanto, é como usar em favor da empresa e seus colaboradores o home office, o trabalho presencial ou o trabalho híbrido, que concilia a não obrigatoriedade diária de ir ao escritório, com checkpoints e feedbacks presenciais. Cada organização vai encontrar a resposta para sua realidade. A decisão só precisa ser menos passional, mais objetiva e visar uma cultura organizacional mais inclusiva.
*Letícia Rodrigues é consultora especializada em diversidade e inclusão e sócia-fundadora da Tree Diversidade.
Photo by Michael Soledad on Unsplash