Nem mesmo uma lesão foi capaz de tirar bailarina do elenco de “Matéria Escura”. Profissão exige cuidados e preparo, inclusive mental, mas pode ser democrática

Apesar de exigir esforço e dedicação, o ofício do bailarino pode ser democrático. Prova disso é o espetáculo “Matéria Escura”, da Companhia de Dança Cena 11, que chega agora à Mostra Lucia Camargo do Festival de Curitiba. Ele tem no elenco nove performers, que vão dos 27 até os 62 anos de idade.

“A gente já teve também na companhia pessoas gordas, e isso nunca impediu ninguém”, garante a dançarina Karin Serafin. “Todo mundo tem o seu lugar dentro da nossa companhia. Ou melhor, todo mundo leva o seu mundo pra dentro da nossa companhia. É assim que a gente entende a dança.”

É claro que a profissão exige alguns cuidados. É preciso manter uma rotina para garantir que se vá chegar inteiro nas apresentações. Dentro do elenco da Cena 11, no entanto, isso varia de cada um para cada um. “A Natascha [Zacheo] faz artes marciais. A Aline [Blasius] é professora de ioga. A Bibi [Bianca Vieira] faz house dance. Tem quem treine kung-fu, faça circo ou natação”, lista Karin. “Eu, por exemplo, gosto de musculação.”

Na seara da alimentação, alguns preferem as dietas vegana ou vegetariana.

A própria Karin já enfrentou obstáculos físicos, mas nem por isso deixou de dançar. Em 2016, ela sofreu uma lesão na coluna ao executar um movimento aparentemente banal: se machucou em casa, ao pegar a bolsa com os equipamentos para ir ao ensaio de “Protocolo Elefante”, espetáculo no qual a Cena 11 trabalhava na época.

Recuperada, hoje não apenas participa de “Matéria Escura” (tomando algumas precauções) como ainda é a responsável pela transmissão ao vivo de cada uma das apresentações, via Vimeo. Por isso carrega nos ombros uma câmera, de um lado pra outro do palco, por cerca de 1h30. “É uma câmera bem pesadinha, e ainda tem um cabo que às vezes atrapalha bastante”, finge reclamar, em tom bem-humorado.

A tarefa deixa Karin Serafin em permanente estado de alerta. “A apresentação é tensa pra caramba. Eu achava que entendia muito de vídeo, dessa coisa de edição, mas ali é diferente. Tudo é editado ao vivo, você precisa decidir na hora o que filmar.”

A dificuldade aumenta porque a coreografia de “Matéria Escura” conta muito com o improviso dos dançarinos, embora existam alguns pontos de referência. “Tem um momento, por exemplo, em que todos precisam estar à frente do palco. Agora, como eles vão fazer isso, como vão chegar lá, depende de cada um”, explica.

Somado ao entrosamento adquirido nos ensaios, o resultado disso é muitas vezes um paradoxo. “Os colegas te surpreendem ao mesmo tempo em que não chegam a te surpreender”, divaga Karin. “Acontece de alguém ocupar um espaço que você tinha pensado em ocupar, e você precisa acionar um plano B na hora. É bom ter um plano B, mas isso sem dúvida causa um estresse mental.”

crédito foto: Karin Serafin

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